quarta-feira, 5 de julho de 2017

A canção é uma arma

A canção, tornou-se numa arma como diz o cantor e, a partir dos anos 60, partilhou fraternalmente o grito alegre e intenso de revolta contra o colonialismo e contra as ditaduras que mancharam a História de Portugal e Brasil.

Coimbra, cidade da Universidade e dos estudantes, onde reinava o fado e a balada, revelou-se um dos berços da canção política.

Já nos anos 30 e 40 o neo-realismo tinha reunido na cidade um número notável de poetas de grande fôlego, alguns dos quais, como Luís Bettencourt, levaram a poesia às vozes do fados e das baladas, unindo as duas grandes expressões culturais coimbrãs que são a canção e a poesia.

A partir do fado e da balada, Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira e outros, vão juntar às toadas tradicionais letras e poemas claramente politizados, especialmente bem recebidos pelos estudantes que começavam a sentir na pele a pressão de uma guerra injusta para a qual a ditadura os empurrava sem piedade.

A canção junta pessoas e vozes. A canção fala e faz falar. Grita. Entra nas Universidades, em muitas igrejas e espaços paroquiais, em clubes operários. A canção é perseguida e proibida. Autores como Zeca Afonso ou Chico Buarque de Holanda são presos inúmeras vezes.

Presos devido às palavras a arder que nos traziam. Presos pela dignidade com que resistiam. Presos pela palavra que insistiam em espalhar.

Adriano cantava os poetas. Em primeiro lugar Manuel Alegre, e outros depois como Manuel da Fonseca, António Gedeão, Raúl de Carvalho e muitos mais. O Zeca cantou menos os poetas mas também o fez desde Luís de Camões, Jorge de Sena, Luís Pignatelli, António Quadros, Ary dos Santos, Fernando Pessoa ou António Aleixo.

Além dos poetas, Zeca escreveu muitas das letras que cantava. Mas também recolheu toadas, melodias e letras da tradição popular das Beiras, do Alentejo, dos Açores, pondo muitas vezes em destaque o seu profundo apelo à liberdade.

Zeca Afonso tomou ainda para si a influência da música africana criando canções que de alguma forma uniram as lutas de um e outro lado do Oceano, tornando claro que a luta dos africanos e dos portugueses era a mesma.

E pode dizer-se sem perigo de demagogia que essas canções também contribuem para o traçado do espaço da lusofonia.

Daqui:

http://jornalcultura.sapo.ao/dialogo-intercultural/na-ponta-do-pe-na-boca-do-povo

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