segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Chorei!

(depoimento de José Paracana)

"Perfeitamente presente, no espírito, o momento em que recebi a triste notícia da morte do nosso Zeca Afonso!
Morava em Aradas, ao tempo, e foi no sótão que eu usava para ouvir música e trabalhar.
Estava a ouvir rádio, o que nem era tão habitual como isso! O locutor de serviço anunciava que o Zeca tinha falecido!

Chorei, como nunca havia chorado por pessoa que não era da família! Muito! Não que seja eu um durão! Mas a figura amiga do Zé Afonso, que eu tive o gosto de conhecer pessoalmente, de com ele falar, ocupava/ocupa no meu cofre de memórias o gavetão mais sumptuoso, mais apreciado!

(...)

Na guerra colonial, foi com o Zeca, com a sua musa e o seu exemplo, que consegui levar de vencida a terrível e podre situação de antagonismo perante indivíduos que compreendia e respeitava: os guerrilheiros, que "construíam o seu país", como ele escreveu e cantou numa das suas trovas!
Para ele o dinheiro era um acessório, e bem que poderia ter vivido muito mais rico, materialmente, do que viveu.

Já depois do 25 de Abril, certa manhã encontrei-me com ele casualmente: vínhamos os dois no comboio para Lisboa, a partir do norte. E na plataforma, a caminho da saída - seriam umas dez e trinta, meti conversa. Fomos seguindo para a porta, até que ele me perguntou: "Tens aí dinheiro? É que venho de uma sessão de canto livre, em Amares, e aqueles mariolas esqueceram-se de me dar alguma coisa. E eu ainda não tomei o pequeno-almoço!"... Palavras para quê? O Zeca era um dos seres que ultrapassa a concepção mais complexa que possamos conceber! Para ele, o que importava mesmo era o seu semelhante oprimido e explorado! Ele, a quem tantos exploraram, na sua imensa despreocupação com os bens materiais deste mundo...

- "Canta sempre para nós, oh Zeca, que é sangue e seiva a tua voz!" disse o Zé Mário. Eu subscrevo. Todos os de boa vontade o farão, também!"

daqui:

http://guitarradecoimbra.blogspot.pt/2007_02_25_archive.html

Nota: O José Paracana autor deste tema, não tem nada a ver com José Pracana, fadista, falecido em dezembro de 2016)

foto: Zeca em canto livre em (?)

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