As trabalhadoras, para impugnar a direção gerido nessa altura por freiras, alegando que as freiras comiam que nem abades e que os velhotes passavam fome, foram pedir ajuda ao Centro Cultural de Setúbal. O sentido do movimento era ocupar as instalações e fazer autogestão - Fora com os parasitas que desviam a boa aplicação dos recursos e comprometem o nível de assistência, clamavam os contestantes... E como toda a gente conhecia o Zeca Afonso, foram a casa dele dizer-lhe o que pretendiam.
Se de um lado a razão revolucionária da época exaltava os ânimos "ocupatórios", do outro, os neófitos guardadores de instituições prenhas de exaltações místicas, aguardavam os revoltosos. Um deles - leiteiro de profissão - encorpado, que já várias vezes se tinha travado de razões com o Zeca, aparece de repente com uma pequena machadinha pronto a fazer saltar sangue de quem ousasse transpor a distância que separa a revolução, da pureza freiriana devota do bem estar, não dos idosos que ali estavam, mas das zelosas barrigas abádicas que pretendiam continuar a preservar.
Zeca, perante tal rompante do leiteiro, tropeça ao recuar, valendo-lhe os que seguraram o braço machadeiro, impedindo-o de cumprir a missão a que estava direcionado.
Tudo para a esquadra. Ao chegar a vez de ser ouvido, declarou Zeca para a autoridade e para os autos que não queria apresentar queixa, dando por sanado o incidente.
À saída, cruzou-se com o leiteiro. Sem nenhuma ironia, o homem estendeu-lhe a manápula subitamente afável:
«Sr. Zeca, amigos como dantes!»
Fontes:
http://arquivo.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=6030
"José Afonso - Um Olhar Fraterno" de João Afonso dos Santos
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